Introdução: a tuberculose (tb) representa uma ...introdução: a tuberculose (tb) representa uma importante questão de saúde pública mundial, sendo a décima terceira causa de mortes no mundo1. estima-se que aproximadamente um quarto da população mundial esteja infectada pela bactéria mycobacterium tuberculosis, agente causador da doença, grande parte dessas infecções ocorrendo na forma de infecção latente por tuberculose (iltb)2. a população pediátrica apresenta particular suscetibilidade à tb, tanto em sua forma ativa quanto latente, estando a doença entre as 10 principais causas de óbitos em crianças no mundo3. crianças encontram-se sob maior risco de progressão para tb ativa quando apresentam iltb, bem como estão mais sujeitas a apresentar formas extrapulmonares ou disseminadas da doença, especialmente aquelas menores de 5 anos de idade4,5. diante da relevância epidemiológica mundial tb, a organização das nações unidas (onu), conjuntamente à organização mundial da saúde (oms), estabeleceu metas para o quinquênio 2018-2022, entre elas o tratamento de 3,5 milhões de crianças com tb ativa e tratamento preventivo de 4 milhões de crianças com menos de 5 anos que são contatos domiciliares de pessoas diagnosticadas com tb1,6. a pandemia de covid-19 representou um importante desafio para o enfrentamento da tb. houve subnotificação e subdiagnóstico dos casos de tb, consequência principalmente da piora do acesso aos sistemas de saúde. segundo estimativas da oms, no ano de 2020, apenas 57,4% dos casos mundiais de tb foram diagnosticados, em comparação a 71% em 2019. em 2021, foram diagnosticados 60,4% dos casos, indicando recuperação parcial nos diagnósticos, porém ainda aquém do cenário pré-pandêmico. esse subdiagnóstico aumenta a circulação da tb na comunidade e perpetua a transmissão, o que pode acarretar em um possível aumento da prevalência da doença. o brasil, juntamente com outros 15 países, foi responsável por 93% da redução das notificações da tb no mundo1,7. além das questões de subnotificação e subdiagnóstico, a pandemia de covid-19 também impactou negativamente no atingimento das metas de tratamento estabelecidas pela onu e oms. entre os anos de 2018 e 2021, 1,9 milhão de crianças com tuberculose e 1,6 milhão das crianças com menos de 5 anos contactantes de casos sintomáticos receberam tratamento, o que representa apenas 54% e 40% das metas estabelecidas até o ano de 2022, respectivamente1. é relevante observar que o controle da iltb, o qual envolve o tratamento de contatos de casos confirmados de tb está entre as principais estratégias para a contenção da doença, considerando seu papel na manutenção da cadeia de transmissão e possibilidade de evolução para a forma ativa da tb2,8. além disso, houve mudanças no perfil epidemiológico dos casos de tb durante a pandemia. houve redução no número de casos notificados de tb e diminuição importante dos contatos investigados em relação ao período pré-pandêmico. entre os contatos investigados, houve aumento dos casos de iltb durante a pandemia. no curso da pandemia, constatou-se aumento da incidência de iltb em pacientes do sexo feminino, e aumento na incidência em pacientes menores de 18 anos9. um estudo conduzido no hospital infantil joana de gusmão (hijg), referência em pediatria no estado, avaliou os prontuários de pacientes encaminhados para avaliação ambulatorial por suspeita de iltb entre janeiro de 2011 e maio de 2020. foram confirmados 112 casos, a maioria em pacientes do sexo feminino e quase metade dos casos em menores de 5 anos. na maioria dos casos, o contágio foi intradomiciliar, geralmente tendo a mãe como caso fonte. o tempo de intervalo entre o início do tratamento do caso fonte e o diagnóstico da iltb na criança foi de menos de 6 meses na maioria dos casos. apenas 60% deles indicavam a realização de investigação para iltb dos demais contatos do caso fonte. a maioria dos casos foi tratado com o esquema 6h, que consiste no uso de isoniazida em dose diária por 6 meses. apenas 50% dos pacientes completaram o tratamento e aproximadamente um quarto das perdas de seguimento ocorreram no terceiro mês de uso da medicação, considerando todos os esquemas terapêuticos10. a opção pelo esquema 3hp, introduzido no sus em 2020, cuja duração total é de 3 meses, pode apresentar-se como uma alternativa eficaz ao problema do abandono do tratamento, potencialmente melhorando as taxas de adesão11,12. o hijg, como já citado, é referência em pediatria para o estado de santa catarina e localiza-se em uma região que concentra grande parcela dos casos de tb na população abaixo de 15 anos no estado13. isso traduz a importância da realização de estudos que avaliem o cenário da tb em santa catarina nos anos de pandemia e pós-pandemia, principalmente para verificar de que maneira esta impactou a prevalência e epidemiologia dos casos de iltb e o enfrentamento da tb no estado. ainda, considerando que nesse período foi introduzido o esquema 3hp no sus, a realização de novos estudos permitiria avaliar se essa nova alternativa terapêutica impactou na adesão ao tratamento da iltb na população pediátrica de santa catarina. objetivos: descrever o perfil clínico e demográfico dos casos de iltb em crianças de 0 a 15 anos incompletos, atendidos no ambulatório de infectologia do hospital infantil joana de gusmão (hijg) entre os meses de junho de 2020 e julho de 2023, a partir de dados presentes nos prontuários. além disso, busca-se também avaliar o impacto da utilização do esquema 3hp (rifapentina em associação com isoniazida em doses semanais por três meses) sobre as taxas de adesão ao tratamento contra iltb nesses pacientes, desde a introdução desse esquema terapêutico no sus. objetiva-se identificar se houve aceitação dos profissionais da saúde com relação à prescrição do esquema 3hp para o tratamento de iltb na população pediátrica, bem como se a utilização desse esquema melhorou a adesão e diminuiu as taxas de abandono de tratamento da iltb entre os pacientes atendidos no hijg, conforme sugerido em publicações do ms para o controle da tuberculose. justificativa: o enfrentamento da tb, tanto a nível mundial como nacional, foi negativamente impactado pela pandemia de covid-19, principalmente pela maior dificuldade de acesso aos sistemas de saúde. houve importante subdiagnóstico dos casos de tb no ano de 2020, com redução de 18% em comparação aos níveis pré-pandêmicos. apesar de ter havido aumento dos diagnósticos em 2021, a recuperação foi apenas parcial, estando ainda muito aquém das metas estabelecidas pela oms. esse subdiagnóstico é preocupante, uma vez que aumenta a circulação da tb. embora um aumento na transmissão decorrente desse cenário possa ter sido em parte contido pelas medidas de isolamento social adotadas durante a pandemia, representa um risco para o controle da tb no cenário de reabertura, traduzindo-se em um possível aumento do número de casos1,7. além da forma ativa da doença, os casos de iltb apresentam também papel relevante na manutenção da transmissão da doença, e tornam-se mais prevalentes com o aumento da circulação da tb. o controle da iltb está entre as principais estratégias para o controle da tuberculose no brasil e no mundo2,8,14. no panorama epidemiológico nacional da tb, santa catarina apresenta-se como um estado de significativa importância. no ano de 2022, representou o 12o estado com maior número de casos de tb notificados na população com menos de 15 anos. o hijg é referência em pediatria no estado, e está localizado na grande florianópolis, região que concentra 25% dos casos de tb na população pediátrica13. dessa maneira, o conhecimento acerca do perfil epidemiológico dos pacientes tratados por iltb no hijg é instrumento necessário para avaliar o panorama do controle da tb no estado. os efeitos decorrentes da pandemia de covid-19 sobre os índices de prevalência e epidemiologia dos casos de iltb e sobre o enfrentamento da tb no estado evidenciam a importância da realização de estudos que incluam tanto os anos de pandemia quanto os anos de pós-pandemia, especialmente para verificação dos impactos resultantes em comparação ao cenário pré-pandêmico.