
Universidade Federal de Santa catarina (UFSC)
Programa de Pós-graduação em Engenharia, Gestão e Mídia do Conhecimento (PPGEGC)
Detalhes do Documento Analisado
Centro: Filosofia e Ciências Humanas
Departamento: Antropologia/ANT
Dimensão Institucional: Pesquisa
Dimensão ODS: Institucional
Tipo do Documento: Projeto de Pesquisa
Título: A PERFORMANCE E SUAS AUSÊNCIAS: ETNOGRAFANDO CORPOS (S)EM MOVIMENTO
Coordenador
- SCOTT CORRELL HEAD
Participante
- SCOTT CORRELL HEAD (D)
Conteúdo
Se, desde a definição minimalista sugerida por ...se, desde a definição minimalista sugerida por e. schieffelin (2018/1998), a performance envolve a criação de presenças, isso levanta certa dúvida sobre quais seriam as ausências da performance, ou o papel dessas na criação dessas ‘presenças.’ meus fins em levantar tal dúvida neste projeto são menos filosóficos ou diretamente teóricos do que etnográficos e - portanto - mais indiretamente teóricos. ou seja, busco levantar a questão de modo suficientemente abrangente para acomodar tanto meus próprios interesses de pesquisa quanto os de orientandxs, sem no entanto limitar os segundos aos primeiros, ou fazer da ‘ausência’ um conceito predefinido que já sobre-determinaria os variados modos com que tal noção possa aparecer - ou ‘ausentar-se’ - na prática. ao mesmo tempo, certamente não é por acaso que ressalto a questão das ausências da performance justamente no presente contexto pandémico: mesmo não constando como temática explicitamente elaborado neste projeto, haveria como entender tal contexto como uma ausência constitutiva do mesmo.
começando de modo mais abrangente, sugiro que pensar a ausência em relação à performance permite tanto ressaltar modos performáticos de tornar ausências palpáveis - como no caso de homenagear pessoas mortas como marielle franco ou mestre moa do katendê num ato político - quanto chamar atenção para as ausências constitutivas de ou neglenciadas por algo entendido como uma performance. evidentemente, entender ou buscar delimitar quais seriam as ‘ausências’ da performance depende igualmente de como entendemos a própria noção de performance e/ou como buscamos contextualizar tal noção ou situar-la em relação a alguma prática em particular. se um lugar-comum para situar a ausência de performance seria o ‘cotidiano’ - tudo que acontece ou deixa de acontecer de modo rotina, sem ‘eventualidade’, também há como descrever a própria vida cotidiana como palco para a ‘apresentação do eu’ (e. goffman 1958). portanto, espera-se que também instigue reflexão sobre aspectos possivelmente ignorados ou mesmo excluídos pelas variadas definições e abordagens da ‘performance’ como conceito, teoria e prática.
neste sentido, a. lepecki (2006) ressalta como a ausência aparente de movimento ou interrupção do fluir de corpos na performance de uma dança (ou dançar de uma performance) ganha implicações políticas inusitadas quando contraposta à ‘ontologia coreográfica da modernidade’, que associa e confunde movimento com progresso e performance com ‘auto-mobilidade.’ em conversa com afirmações a respeito da impossibilidade ontológica de ’sujeitos negros’ no contexto do humanismo europeu, s. colbert (2017) afirma a necessidade de voltar-nos a tradições estéticas-sensoriais que aparecem nos arquivos e repertórios do conhecimento e ação humana como ‘ausências’ e/ou expressões ‘irracionais’ vis-a-vis os modos de produção de conhecimento ‘des-encorporados’ valorizados desde a tradições eurocêntrica hegemônica. f. moten (2015) sugere, no entanto, que seja necessário pensar certas instâncias como ‘não-performance’ ao recusar o pressuposto de livre arbítrio implicado no ato de ‘performar’ - uma questão que ganha relevância particular em relação a noções de ‘negritude’ na medida que as próprias noções de livre arbítrio e ‘contrato social’ foram elaboradas em consonância com contextos de escravidão legal e/ou efetiva; deste modo, moten volta a atenção para as socialidades negras ante-normativas (substituindo o ‘i’ por ‘e’ para não reduzir tais socialidades à oposição a tais normas) que compõem algo como a ausência constitutiva de ‘performances’ negras.
redirecionado essas refrações teóricas do enfoque mais abrangente nas ausências constitutivas da performance aos meus próprios interesses de pesquisa, lido com a questão da temporalidade da performance implicada nesse enfoque. já há um tempo, a análise influente de peggy phelan (1993) da performance como arte apontou para a dimensão paradoxal da presença da performance na medida que o presente em que a performance acontece está sempre desaparecendo. se deste modo ela buscou dar atenção aos aspectos ‘não-marcados’ da performance e ao mesmo tempo questionar a possibilidade de registar justamente esses aspectos que considerava constituir o cerne da performance como tal, essa abordagem passou a minimizar a relação temporal implicada na performance entre esse presente-que-passa e o passado e futuro aos quais a performance não deixa de apelar. buscando tornar tal enfoque mais nítido, tomo como principal ‘objeto’ da minha pesquisa a realização de gestos: seja como micro-performances em si, seja como ‘interrupções’ que irrompem no fluir de uma performance, deste modo tornando capazes de ressaltar tanto o antes e depois da própria performance quanto do mundo-em-movimento em que a performance é realizada. passei a me interessar em particular em gestos que encenam o ato de matar. ao contrapor certos desses gestos ‘necro-poéticos’ entre si, ressalto como os sentidos radicalmente distintos dos mesmos só ganham nitidez na medida que as temporalidades respectivos implicadas nesses gestos são levadas em conta. neste projeto, pretendo elaborar as implicações dessas temporalidades ‘em excesso’ do tempo da realização de gestos no modo com que entendemos a corporalidade e conhecimentos corporais.
estender o enfoque nas ‘ausências’ constitutivas da performance aos projetos de pesquisa de meus orientandxs atuais, permite ressaltar fenômenos - e contextualizações etnográficas das mesmas - bastante diversas. ofereço alguns exemplos possíveis (extrapolações ‘minhas’ de certas dessas pesquisas, mesmo que ainda em ‘fase de composição’):
1. tanto no caso do dançar do coco nordestino no sul do brasil, quanto no da vinda do ‘dance-hall’ desde jamaica ao brasil, há como pensar modos de ‘presenciar’ a ausência de seus contextos de origem nessas performances musicais e dançadas em relação às ausências constitutivas desses gêneros musicais enquanto ritmos - no caso, a omissão repetida de uma batida no desdobrar dessas músicas, que - seguindo a noção de ‘síncope’ que muniz sodré elabora em relação à samba e outras formas musicais afro-diaspóricas - institui um ‘tempo fraco’ que convida a participação de corpos como se fossem ‘preencher’ essas lacunas repetidas. ao mesmo tempo, no presente contexto, a ausência de corpos aglomerados para acompanhar e dar corpo a esses ritmos sincopados é capaz de ser redimensionado por outro princípio afro-diaspórico, nesse caso ritual, segundo a noção de resguardo (cardoso 2021), que assim preservaria a possibilidade desses corpos voltarem a dançar e agir futuramente, seja em contextos religiosos, culturais e/ou políticos;
2. o efeito da ausência de contato físico nos modos com quais e lugares onde artistas ‘trans’ e negras performam a ausência de demarcações heteronomativas de gênero. e a presença da ‘raça’ e racismo como condição social, histórica e/ou identitária a pesar da ausência da ‘raça’ como distinção biológica, em tempo de pandemia no nordeste; a ausência de contato físico imposta pelo contexto pandêmico acaba também afetando como corpos performáticos surgem em contextos eróticos de práticas associadas ao fetichismo/bdsm e/ou teatro burlesco;
3. o impacto da ausência de pessoas presas na vida de pessoas do outro lado do muro de presídios. se narrativas constituem um dos modos efetivos de atravessar os silêncios e violências ocultas implicados por esses muros e pelos ‘rituais’ altamente invasivas aos quais visitantes aos presídios são sujeitos, no presente momento nem histórias das pessoas presas - sejam vivas ou mortas - chegam a atravessar esses muros. nesses tempos pandêmicos, a ausência de ação em relação aos efeitos potencialmente mortíferos do vírus intensifica a performance já normalizada da indiferença - da ausência de laços afetivos sem a qual a noção de ‘humano’ perde qualquer sentido substantivo - no contexto entre-muros de tal modo que essa ‘inação’ transforma-se em ação incomensuravelmente mais violenta que o atirar de um revólver.
entendo o enfoque nas ausências da performance como um projeto necessariamente aberto e sujeito a mudanças, na medida que a diferença entre as presenças e ausências da performance é em parte a função do enquadre dado e a relação dessa com o objeto enquadrado. parte fundamental da proposta desse projeto consiste no pressuposto que os ‘objetos’ das nossas pesquisas acabarão revelando outras ausências - e presenças - que aquelas inicialmente cogitadas.
Índice de Shannon: 3.72831
Índice de Gini: 0.904034
ODS 1 | ODS 2 | ODS 3 | ODS 4 | ODS 5 | ODS 6 | ODS 7 | ODS 8 | ODS 9 | ODS 10 | ODS 11 | ODS 12 | ODS 13 | ODS 14 | ODS 15 | ODS 16 |
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3,85% | 3,91% | 5,55% | 12,04% | 5,69% | 3,58% | 3,92% | 6,21% | 6,69% | 3,66% | 5,67% | 5,53% | 4,48% | 3,86% | 3,26% | 22,09% |
ODS Predominates


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